Uso de anabolizantes para fins estéticos e esportivos traz riscos à saúde

Foto: Alex Régis

O Conselho Federal de Medicina proibiu os médicos de prescreverem anabolizantes para o propósito esportivo, ganho de massa muscular ou fins estéticos. A nova medida foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) no último dia 11 de abril. Por conta dessa decisão, ampliou-se o debate sobre o tema. A nova medida serve para pacientes que são atletas e não atletas. Como forma de repercutir o assunto, a reportagem da TRIBUNA DO NORTE, então, ouviu uma endocrinologista e uma pessoa que usou e sofreu os malefícios do uso indevido de esteróides.

A médica endocrinologista Larissa Pimentel entendeu como positiva a decisão do Conselho porque, cientificamente falando, o método usado por pessoas que não necessitam de uma ajuda hormonal não traz benefícios terapêuticos para o corpo, fisiologicamente falando.

“Não existe nenhuma comprovação na literatura, nem mesmo científica, mostrando que seja seguro, eficácia terapêutica com segurança para esse tipo de paciente que não necessita de uma reposição hormonal”, explica a Doutora.

A reposição hormonal é um tratamento, comum entre homens e mulheres quando chegam em determinadas idades, utilizado quando a pessoa não consegue produzir um número adequado para o funcionamento específico daquele hormônio. “O uso é permitido quando a pessoa tem deficiência dos hormônios comprovados. Então, hoje, é comum, a gente encontrar, inclusive, a prescrição desses hormônios para fins estéticos desses esteróides anabolizantes, mascarados de outros nomes, como implantes hormonais, como passado por via transdérmica, usada através da pele, chip da beleza”, citou.

A nutricionista falou, também, que muitas pessoas acabam sendo enganadas por produtos que são implantes hormonais.  “A questão é que muitas pessoas usam achando que não são anabolizantes”. Por conta do uso “mascarado”, certos produtos hormonais caíram nas graças do público, inclusive com pacotes de benefícios prometendo: boa noite de sono, disposição, aumento da libído, pele firme, além de um corpo sem celulite e com uma porcentagem mínima de gordura.

Diante dos fatos, várias sociedades médicas, incluindo a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), fizeram uma carta solicitando a volta da regulamentação dos esteróides anabolizantes. Depois disso, o Conselho acatou o pedido e proibiu os médicos de repassar a receita.

Nos homens, a terapia de reposição hormonal mais utilizada é voltada para a testosterona, principal substância química masculina. Também é responsável pelo desenvolvimento de tecidos reprodutivos masculinos, como testículos e próstata. Como é o caso também do aumento da massa muscular, maturação dos ossos e do cabelo corporal.     Pela responsabilidade do funcionamento de muitas atividades dentro do organismo, o uso indevido dos compostos anabolizante podem causar problemas que vão do coração ao fígado. Ou seja, causando efeitos danosos que podem levar a doenças problemáticas, como exemplifica a médica Larissa Pimentel.

“Nos deparamos com pacientes com conseqüências, que colocam em risco a saúde do paciente, pelo uso dos anabolizantes. Nós atendemos muitos pacientes com problemas cardiovasculares, como infarto, câncer, secundário ao uso do anabolizante; hepatite, por conta do uso do anabolizante pode ocasionar insuficiência hepática”, listou a médica.

Outro efeito colateral perigoso são impactos que podem causar na saúde mental do indivíduo, isto é, transtornos psiquiátricos como depressão, ansiedade, agressividade, insônia e até suicídio.

Segundo estudos, o composto químico do produto altera os genes dos neurônios que produzem substâncias que trazem relaxamento, bem-estar, alegria e prazer, como o caso da serotonina e dopamina. Por isso não é incomum o usuários ficar mais estressado, frustrado e mais agressivo com as pessoas. Isso leva ao aparecimento da ansiedade e da depressão.

“Pacientes com problemas psiquiátricos se tornaram comuns. Por causa do uso de anabolizantes, as pessoas desenvolvem o quadro da depressão. Quando as pessoas fazem o uso para essa iniciativa estética, elas são reféns de profissionais que só explicam os benefícios e escondem os malefícios para a saúde do paciente”, declarou.

Lembrando que médicos que insistirem na indicação desse tipo de tratamento podem sofrer punições nos conselhos regionais de medicina, que vão desde uma advertência até a perda do registro – dependendo do caso.

Problemas Psicológicos

O publicitário Dácio Lima, de 33 anos, fez o uso do sintético quando tinha 22 anos. Ele tinha uma rotina normal de treinos, o que gerou, naturalmente um aumento de massa muscular. Porém, Dácio queria mais e percebeu que um amigo estava tendo um resultado muito satisfatório. Ao saber qual era o “segredo”, resolveu fazer o mesmo. O publicitário comprou o superdrol, esteróide anabólico, usado em forma de ciclo, quando o usuário precisa utilizar durante um intervalo de tempo.

“Na época, eu treinava sem o uso de anabolizantes. Encontrei com um amigo que já tinha feito o uso e falou qual era. Por ter visto resultado nesse amigo e querer ter um pouco de resultado no meu corpo, querer ficar mais forte, querer chamar mais atenção. Eu fiz o uso desse anabolizante”, relembrou.

O diretor de arte passou a fazer o uso, em forma de cápsula, uma vez por dia. No décimo dia de ciclo, enquanto trabalhava, ele teve uma taquicardia – quando o coração acelera o batimento de maneira irregular – e foi para o hospital encontrar o causador desse problema. “Começou uma longa jornada para descobrir o que tinha. Só fui descobrir um ano e meio depois que era um efeito colateral desse anabolizante, que gerou taquicardia e ansiedade. Por conta desses sintomas fui diagnosticado com a síndrome do pânico e comecei a ter ataques”.

Síndrome do pânico é caracterizada por crises de ansiedade repentinas e intensas geradas pelo contexto em que a pessoa se encontra ou gatilhos emocionais que desencadeiam essa patologia. “Eu sempre dou o conselho para não fazer o uso. Eu sou prova viva que tive uma experiência negativa e não recomendo de fato. Não vale a pena correr o risco de desenvolver uma doença, como aconteceu comigo. É melhor procurar os meios naturais, como a suplementação e alimentação do que tentar acelerar e pagar um preço mais alto hoje ou futuramente”.

Resolução do CFM proíbe prescrição

A prescrição médica de terapias hormonais com esteroides androgênicos e anabolizantes (EAA) para fins estéticos está proibida, de acordo com resolução Resolução 2.333/23 do Conselho Federal de Medicina (CFM). O documento aponta que não há comprovação científica suficiente para o uso dessas substâncias para ganho de massa muscular e melhora do desempenho esportivo.
Foto: Alex Régis

“Nós estamos observando no Brasil um aumento exponencial da prescrição”, afirmou o presidente do CFM, José Hiran Gallo. “Ouvimos especialistas no assunto, que foram unânimes em afirmar que os benefícios da utilização dessas medicações para esses fins não superam os riscos. Não existe dose mínima segura, como alguns usuários alegam. Por isso, estamos proibindo.”

A relatora da resolução, Annelise Menegusso, foi na mesma linha. “O uso indiscriminado de terapias hormonais com EAA, incluindo a gestrinona, é hoje uma preocupação crescente na Medicina e para a saúde pública, uma vez que, de acordo com as mais recentes evidências científicas, não existem benefícios notórios que justifiquem o aumento exponencial do risco de danos possivelmente permanentes ao corpo humano.”

Dentre os efeitos adversos possíveis do uso sem prescrição estão os cardiovasculares, incluindo hipertrofia cardíaca, hipertensão arterial sistêmica e enfarte agudo do miocárdio, aterosclerose, estado de hipercoagulabilidade, aumento da trombogênese e vasoespasmo; doenças hepáticas, transtornos mentais e de comportamento, incluindo depressão; além de distúrbios endócrinos como infertilidade, disfunção erétil e redução da libido.

A prescrição médica de terapias hormonais é indicada em casos de deficiência específica comprovada, como no tratamento de doenças como hipogonadismo (deficiência na produção de testosterona), puberdade tardia, micropênis neonatal e caquexia (perda de massa muscular por motivo de doença). Também pode ser indicada na terapia hormonal cruzada em transgêneros e em mulheres com diagnóstico de desejo sexual hipoativo. “Nada muda em relação às indicações que já existem na literatura médica e têm respaldo científico”, afirmou José Hiran Gallo. “Nesses casos, entendemos que os benefícios compensam os riscos do uso.”

Fonte: www.tribunadonorte.com.br