Padre João Medeiros Filho
Estudiosos de várias ciências e representantes de diferentes matizes religiosos procuram analisar o atual clima de insegurança, medo e ameaças. No Brasil de hoje, pressente-se um mal-estar, psicológico, sociopolítico, moral e religioso. Autoridades insurgem-se umas contra as outras, em mútuas e constantes coerções. Setores da economia tornam pessoas insones. A precariedade dos serviços públicos de saúde, educação, segurança e outros deixam cada vez mais a população desassistida e aflita, apesar da negativa dos responsáveis. Governantes continuam recitando a ladainha da escassez de recursos para gerir os diversos setores. “Administrar exige criatividade”, dizia Santo Tomás de Aquino. Pastores de almas vislumbram dias apocalípticos em virtude da negação de valores éticos. Trafega-se na contramão do anúncio proclamado pelo anjo, na Noite Santa: “Eis que vos anuncio uma grande alegria.” (Lc 2, 10). A mensagem de Cristo é um aceno de paz e Boa Nova (Evangelho). Outrora, crentes e agnósticos viveram épocas tenebrosas. Impossível esquecer a fogueira da Inquisição e os horrores do Holocausto. Houve momentos em que alguns pregadores apontavam a porta do inferno aos fiéis, considerando-se proprietários do céu. Entretanto, a intranquilidade hodierna não é menos difusa e dolorosa. Passam-se os anos e procura-se ainda esconder a beleza do Evangelho com mantras e adereços ideológicos, ofuscando a ternura cativante de Jesus.
Vive-se, física e espiritualmente, numa sociedade ameaçadora e intranquila. Muitos sentem a dor da desolação e as investidas da tecnologia com suas consequências e das ideologias reinantes. Os adeptos destas servem-se inescrupulosamente de tudo, máxime da mensagem dos profetas do caos. Ao sofrimento fisiológico soma-se o mental. Para amenizá-lo não basta a indignação ética. Urgem fraternidade e compaixão. O cristianismo é a religião do bom samaritano, relatada na parábola de Lucas (Lc 10, 25-37). Em tempos inseguros e amedrontadores, precisa-se cultivar a semente da esperança. Pairam temores e inquietudes, gerando desconforto. As agruras individuais e a infelicidade coletiva são o preço de desmandos, omissões e desigualdades, ao longo de anos, resultado de um descaso público crônico.
As pessoas andam tensas. São tomadas por más notícias e imagens tristes, registrando dores e terrores. Veiculam-se raros noticiários de fatos positivos, construtivos e portadores de alegria. O Brasil lida com ameaças, agravadas pelos surtos de dengue, viroses etc., neste final de pandemia. Os sofrimentos que disso decorrem, acrescidos de palavras atemorizantes, tornam as pessoas confusas e abatidas. As igrejas têm o dever de consolar e animar o povo, como proclama o salmista: “Deus é nosso refúgio e fortaleza, socorro sempre encontrado nos perigos, por isso não há o que temer” (Sl 46/45, 1). A Bíblia é pródiga em palavras de alento e encorajamento. Os cristãos necessitam ser precursores de paz e mensageiros da renovação.
Atravessa-se o ocaso de uma era. O pôr do sol é hipnotizante, justamente por carregar um misto de indefinições e dúvidas. “Elegante melancolia do crepúsculo”, proclamava Charles Chaplin. A tristeza traz em seu bojo a força de transformar a aparente decepção em luz e vida. Hoje, é preciso pedir com insistência renovada, como os discípulos de Emaús, no entardecer pascal: “Fica conosco, Senhor, pois já é tarde e a noite vem chegando.” (Lc 21, 29). Aos líderes religiosos cabe relembrar que “a luz brilhará na escuridão.” (Jo 1, 5). Compreende-se o desânimo que se abate nesse dramático momento brasileiro, sobretudo num conturbado ano eleitoral. Por isso, é bom ter em mente as palavras de Jesus: “Estarei convosco todos os dias.” (Jo 16, 33).
Nestes tempos difíceis venha a lição da natureza, convidando-nos a aquietar e esfriar os ânimos. Praza aos céus que uma nova estação acalme os espíritos exaltados dos brasileiros, o radicalismo e o desrespeito aos outros. A metáfora das flores coloridas ensina aos homens que não é possível antecipar o florescimento. Entretanto, é factível transformar o “inverno” no despontar (em nós) de um novo ser humano. Ele poderá ser belo, fecundo e transformador. É preciso arrefecer as emoções intransigentes e o pessimismo para brotar a serenidade. As árvores dão-nos uma lição: as folhas caem, mas a vida persiste, mesmo em dias sombrios e frios. Deus cuidará sempre de nós. “Ele é o teu escudo de defesa e a tua espada que faz triunfar.” (Dt 33, 29).