O silêncio dos culpados

Foto: reprodução – O advogado criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay

Muitas vezes, é nos momentos mais delicados, extremos até, que a pessoa mostra seu verdadeiro caráter e sua índole. O Brasil foi dividido pelo radicalismo bolsonarista, que apostou no ódio e na política de desinformação para se impor. Com uma estratégia pensada e planejada na divulgação de mentiras encomendadas, o governo do  Bolsonaro criou uma incrível massa de seguidores incapazes de discernir, sequer de maneira razoável, o que é falso e o que é verdadeiro. Nas campanhas e no exercício do poder, a disseminação de fake news sempre foi um alvo criteriosamente trabalhado.

São inúmeros os exemplos bizarros que foram cristalizados e que assumiram ares de verdade, seja para incensar posturas teratológicas, seja para destruir reputações. É extremamente difícil se contrapor a um grupo que não tem limites, ética e nem escrúpulos. A discussão política, que engrandece e fortalece a Democracia, precisa de critérios que sustentem e prestigiem os valores humanistas para a manutenção do Estado democrático de direito. Lidar com seres escatológicos impede o exercício dos princípios fundantes da civilização.

Com a dimensão da tragédia no  Rio Grande do Sul, criou-se uma expectativa de que essas posturas seriam abandonadas em solidariedade ao imensurável sofrimento do povo gaúcho. Imaginávamos que não existiria lugar para banditismo, para o uso político de mentiras e para uma disputa de espaço com base na dor e na desgraça alheia. Ledo engano. O homem surgiu no meio das águas com suas vertentes mais díspares e completamente expostas. Escancaradas. Tanto na extrema dedicação da solidariedade, quanto no absoluto mau-caratismo das fake news e dos abusos.

Já se discute entre os criminalistas a dificuldade de criminalizar as condutas dos criminosos que as espalham. O certo é que é necessário responsabilizar as consequências dessas mentiras. Não é apenas, e já seria grave, a monetização das postagens e o despudorado uso político por parte desse grupo. O que mais deve ser levado em consideração é o tanto que as desinformações influenciam as pessoas e dificultam o salvamento. O discurso e as ações solidárias mostram que a humanidade ainda tem chance no meio deste caos. A grande maioria dos brasileiros se mobiliza para ajudar e tentar minimizar esta dor inimaginável. O número de mortos e desabrigados nos deprime. Mas a quantidade de pessoas recuperadas e salvas nos enche de esperança.

O governo federal se mobilizou de uma maneira admirável. Sob todos os aspectos, o apoio ao povo do Sul está sendo a prioridade máxima. A seriedade com que a  gestão Lula está sendo construída enfrentando o desastre é inquestionável e só a má-fé pode levantar qualquer dúvida.

As fakes news insistem em tentar diminuir a imensa ação solidária do governo federal. E a cara de paisagem do governador do Estado, que não tem a grandeza de reconhecer o trabalho do Presidente da República, reforça a máxima de que é nas horas trágicas e difíceis que se conhece o tamanho do político. Tudo que é possível está sendo feito. Mas é hora de o governo federal começar a, estrategicamente, contar, com detalhes e com profundidade, o que realmente está ocorrendo. Prestar contas é também dever do governante. E, no caso concreto, é necessária uma ação política que ajude a combater as fake news e os políticos responsáveis por agravar essa tragédia. E que insistem em figurar como falsos heróis. A hora é de solidariedade. Mas a hora de apontar os culpados já bate à porta.

Como nos lembra o poeta Thiago Turbay: “Nada contém mais palavras do que o silêncio. O silêncio aceita tudo”.

Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay.

www.ultimosegundo.ig.com.br