Padre João Medeiros Filho
Em artigo anterior (nesta coluna) abordamos, dentre outros aspectos, a falta de respeito, que dificulta o convívio. Para aqueles que o valorizam e consideram-no uma condição para a convivência saudável, torna-se fácil comprovar essa triste realidade: o respeito está em agonia. No contexto da atual sociedade, tal virtude, há muito, deixou de ser um valor na escala axiológica. E, por isso, verifica-se que cada vez menos as pessoas conseguem, em seu cotidiano, obedecer aos seus limites, ter em mente a dignidade do outro, perceber a fragilidade da vida, o equilíbrio da realidade social e da “Casa Comum”, consoante a expressão do Papa Francisco.
Segundo estudiosos, não se trata simplesmente de má vontade ou da ausência de caráter, mas de perda cultural e moral. De fato, estão desaparecendo a capacidade, as condições e as possibilidades de sentir e transmitir o respeito como valor estruturante do conviver. Isso acontece também porque se aceita a influência perversa da pressa. Passa-se a viver num corre-corre insano e desumanizador. Atropelam-se e ignoram-se valores, instituições e pessoas. Nisto reside também o desrespeito. Acolhe-se e registra-se tacitamente, como axioma inquestionável, uma espécie de imperativo categórico da mentalidade capitalista: “Time is money” (tempo é dinheiro). Com isso, de modo frenético, diariamente muitos se entregam, conscientemente ou não, aos vorazes e insaciáveis preceitos de “cronos”, o deus do tempo. Neste embalo também presta-se culto a “mamon”, a divindade do dinheiro, que promete libertar o ser humano das garras sufocantes de “cronos”. Não raro, pensa-se desta forma: quando se acumular bastante dinheiro, ter-se-á tempo para poder gozar plenamente a vida! Deste modo, sacrificam-se a existência e as relações com os outros.
Assim, sem a percepção das consequências, forja-se um jeito doentio de convivência. Não se tem mais tempo para assimilar as experiências vividas, as lições diárias que a vida gratuitamente oferece. Destrói-se o berço natural e indispensável para internalizar o respeito como virtude humana. Não é à toa que etimologicamente o termo provém do latim “respectus” – particípio passado de “respicere” – que significa olhar novamente. Ele nasce da consciência de que as pessoas, os fatos para serem compreendidos ou aceitos precisam de outros olhares e isto necessita de paciência. Exige a reverência de nossa atenção e cuidado. Sem isso não há consideração, tampouco um relacionamento saudável entre as pessoas. A educação, o amor, a amizade e outros valores ou sentimentos construtores da existência não funcionam sem um dedicado cultivo da paciência. Aí, de fato, entende-se que a pressa é inimiga da vida humana e, por conseguinte, desrespeitosa.
Não se tem mais tempo disponível para contemplar coisa alguma. Por isso, infelizmente, elimina-se a capacidade de transmitir a experiência fundante do respeito. Acompanhar a evolução da vida na pequena semente que brota, deleitar-se com o pássaro entoando seu canto matinal, emocionar-se com a pureza de uma criança, seu sorriso e o engatinhar de seus primeiros passos, tudo isso parece passar despercebido. A pressa não leva as pessoas a valorizar o andar inseguro e o olhar profundo de um idoso para a vida. Abandona-se a contemplação poética e orante de deixar-se iluminar pela magia do ocaso e da aurora, ou ainda, ser tomado pela beleza do céu estrelado e do contínuo balanço das ondas do mar… Não se tem mais tempo de avaliar a violência cultural, que está submetendo lentamente muitos à morte interior. A pressa – além de destruir o respeito – está aniquilando o hábito da contemplação, da poesia e da prece.
Vale a pena a leitura e a reflexão de dois textos: o poema-oração de Michel Quoist: “Não tenho tempo, Senhor”, em “Poemas para rezar”, ou ainda a canção do acadêmico pernambucano Oswaldo Lenine: “Paciência”. Ali enfatiza: “Enquanto o tempo acelera e pede pressa, eu me recuso… O mundo vai girando cada vez mais veloz… mas espera de nós paciência”. O apóstolo Pedro já aconselhava os cristãos de seu tempo: “Tratai todos com a devida reverência e respeito, amai os vossos irmãos e a Deus tendes temor” (1Pd 2, 17).