Jucurutu, paróquia sesquicentenária


Padre João Medeiros Filho

Há consenso entre os historiadores sobre o ano de criação da Paróquia de Jucurutu: 1874. Entretanto, dois expoentes de nossa história – Câmara Cascudo e Tavares de Lyra – divergem quanto ao orago e mês da elevação à categoria de matriz. Para o primeiro, a freguesia foi erigida em 1º de agosto, tendo como patrono São Sebastião. O segundo indica a data de 1º de setembro, sendo padroeiro São Miguel Arcanjo. Cascudo é fiel às fontes eclesiásticas, enquanto Tavares de Lyra prende-se aos registros civis, abordando temas religiosos. A Lei Provincial 707/1874/RN citada por ambos, erigindo a freguesia, é apenas uma das peças do processo de criação, sendo indispensáveis a autorização imperial e o decreto do bispo diocesano. Isto ocorria por força do regime do Padroado, herança da Coroa Portuguesa, em vigor no Brasil. Em razão dessa concordata entre o Brasil e a Santa Sé, o Imperador gozava das prerrogativas de escolher bispos, párocos, vigários, cônegos, capelães, criar, suprimir dioceses, paróquias, capelanias, irmandades etc. Ao Sumo Pontífice e aos bispos cabia confirmar os atos.
Poucos historiadores tratam da presença dos jesuítas no RN, no período colonial. Cascudo tece elogios ao trabalho catequético-evangelizador dos padres da Companhia de Jesus. Devotos de Maria Santíssima, São João Batista e dos anjos, deixaram essa marca devocional por onde passaram. Nas antigas Reduções (RS) destaca-se a existência de cidades e paróquias identificadas com os nomes de São Gabriel, Santo Ângelo, São Miguel das Missões etc. No RN, não foi diferente. Em Arês (nas origens, conhecida por São João Batista de Guaraíras) introduziram a devoção ao precursor de Cristo. Na cidade de Extremoz (antiga São Miguel de Guajiru) difundiram a veneração ao Arcanjo, sendo até hoje o seu patrono.
Posteriormente, os discípulos de Santo Inácio de Loyola adentraram os sertões potiguares, fixando-se em Angicos, cujo aldeamento teve nos primórdios o nome de “Curral dos Padres”. Os jesuítas não são denominados frades, e sim padres. De Angicos, rumaram para Assú, cujo padroeiro é São João Batista. Dali, foram até Apodi, onde catequizava Padre Felipe Bourel. Estiveram em Caiçara Velha (hoje São Rafael), tomando a direção de Jucurutu, estabelecendo-se à margem de um riacho, afluente do Rio Piranhas-Açu. “Eles eram perseverantes no ensinamento dos apóstolos” (At 2, 42). A notícia mais precisa sobre os jesuítas em Jucurutu vem do Padre Serafim Leite, em História da Companhia de Jesus no Brasil: “Perseguidos, os nossos [termos como os jesuítas chamam seus confrades] se refugiaram numa pequena aldeia, administrada pela Companhia [de Jesus] que do Arraial [Assú] dista cerca de dez léguas, à margem de um rio, povoado de piranhas, que banha igualmente o citado arraial.”

Paira uma dúvida sobre o orago da paróquia jucurutuense. Já se aludiu à divergência de Cascudo e Tavares de Lyra sobre essa questão. Para o pesquisador caicoense, Monsenhor Francisco Severiano de Figueiredo, “o primeiro padroeiro de Jucurutu foi São Miguel Arcanjo.” A essa invocação alude outro caicoense, Padre Sebastião Constantino de Medeiros, governador do bispado de Olinda. Desde a época de aldeia à elevação como cidade, o lugar denominava-se São Miguel de Jucurutu. Posteriormente, em consequência de um voto, os habitantes solicitaram ao bispo de Olinda, Dom Frei Vital Maria Gonçalves de Oliveira, a mudança de orago do então povoado. Isso aconteceu quando grassava a epidemia do “colera morbus”, pós-guerra contra o Paraguai. A partir de então, São Sebastião passou a ser o protetor.
Alguns pesquisadores apontam o Santo de Narbona (Sebastião) como patrono na criação da freguesia, arrimando-se em Padre Gabriel Malagrida, jesuíta missionário nos sertões nordestinos, o qual asseverou: “Aos males que nos fazem, respondamos com o bem. Assim, a triste figura de Sebastião José de Carvalho e Melo [Marquês de Pombal] seja ignorada, denominando-se a paróquia por um santo de igual nome, apagando assim a memória de um personagem ímpio de nossa história.” Em 2023, pensando no sesquicentenário, o sétimo bispo de Caicó, Dom Antônio Carlos Cruz dos Santos, pelo Decreto Diocesano 18/2023, anexou salomonicamente a invocação de São Miguel ao lado de São Sebastião, declarando-os padroeiros de Jucurutu. O apóstolo Paulo suplicava: “Irmãos, estejais todos de acordo com o que dizeis para que não haja divisão entre vós” (1Cor 1, 10).