O governo Lula enfrentou um golpe de Estado apenas oito dias após a posse. Milhares de terroristas entraram nas sedes dos Três Poderes e depredaram o patrimônio público. A par da violência da manifestação, do claro intuito de ruptura institucional e do envolvimento de empresários e militares, uma questão há que ser analisada e estudada: o ódio que dominava boa parte dos golpistas. A impressão que ficou no ataque covarde e vil ao Plenário do Supremo é a de que, se os Ministros estivessem na Corte, teriam sido mortos. Necessário que façamos uma reflexão sobre a origem desse ódio, até para enfrentá-lo.
Em regra, a política brasileira sempre foi feita com uma convivência no mínimo perto da civilidade. Quando o Lula se elegeu a primeira vez, em 2002, o então Presidente Fernando Henrique Cardoso disponibilizou a residência da Granja do Torto para que ele a ocupasse durante o período da transição. E a entrega da faixa por um intelectual e professor para um operário que se colocava como o maior líder político do Brasil foi carregada de simbolismo. No último aniversário do ex-Presidente, fiz questão de cumprimentá-lo dizendo ter muitas saudades do tempo em que ele era a oposição. Saudades, na verdade, de um Brasil civilizado.
Interessante a entrevista do professor Fábio de Sá e Silva, na Folha de S.Paulo de 15 de janeiro, na qual aponta a origem das atitudes atentatórias às instituições, especialmente ao Judiciário, na Operação Lava Jato. Há muito tempo, tenho escrito que são o ex-juiz Sérgio Moro e seus procuradores adestrados os responsáveis diretos pelo fascismo instalado por Bolsonaro. É claro que existe toda uma conjuntura internacional de crescimento da ultradireita no mundo. Mas, aqui, o ovo da serpente foi gestado no seio da Lava Jato.
A estratégia de marketing daquela operação, com o apoio da grande mídia, era intimidar os Tribunais Superiores, especialmente o Supremo Tribunal Federal. Com uma metodologia quase infantil e maniqueísta, foi difundido que quem denunciava os abusos lavajatistas era a favor da corrupção e contra o combate à criminalidade. Para disseminar essa falsidade vulgar, não relutaram em espalhar verdades encomendadas contra alguns Ministros do Supremo e contra o próprio STF. O Judiciário eram eles: os detentores da verdade, o juiz de jurisdição universal, os procuradores mais poderosos do que a própria instituição do Ministério Público, os semideuses e os heróis nacionais.
Esse grupo da Lava Jato foi que prendeu, injusta e criminosamente, o então candidato Lula e abriu caminho para a vitória do fascista Bolsonaro. O ex-magistrado ganhou de recompensa o Ministério da Justiça. E o Presidente cuidou de alimentar o ódio e a violência como principais características do seu governo. Foram quatro anos de ataque frontal às instituições.
Um Poder Executivo fascista e corrupto subjugou e cooptou boa parte do Legislativo e violentou o Judiciário com ataques vis e irresponsáveis. Numa tentativa golpista de quebrar a institucionalidade, o próprio Presidente Bolsonaro intentou, por diversas vezes e com palavras de baixo calão, inclusive, contra o Supremo Tribunal, contra o Tribunal Superior Eleitoral e contra as pessoas dos Ministros e Ministras. Um dos filhos do Presidente chegou a afirmar que, para fechar o Supremo, bastava apenas um soldado e um cabo. Canalhas. Mil vezes canalhas.
O ódio e a violência eram o alimento dessa seita ensandecida bolsonarista e os responsáveis por essa disseminação, como estratégia de poder, têm que ser punidos. Os ataques sistemáticos às pessoas simpatizantes da esquerda levaram a agressões físicas e verbais e até ao assassinato covarde de petistas. Mas os alvos preferidos eram, e continuam a ser, as autoridades do Judiciário.
O fascismo bolsonarista, que vive na lama e no esgoto, só vem à luz do dia para atacar a Democracia. E foi esse acúmulo de ódio que eclodiu e que fez o tumor supurar no último dia 8 de janeiro. O dia da infâmia. Que só não se repetirá se responsabilizarmos criminalmente os executores da violência, claro, mas principalmente os mentores dessa estratégia golpista baseada no ódio que dividiu a sociedade brasileira. Todos sabem quem são os responsáveis. Resta fazer valer a lei e a Constituição.
Lembrando-nos de Vinicius de Moraes, no poema “Pátria Minha”:
“Quero rever-te, pátria minha, e para
rever-te me esqueci de tudo.
Fui cego, estropiado, surdo, mudo.
Vi minha humilde morte cara a cara
Rasguei poemas, mulheres, horizontes
Fiquei simples, sem fontes.”
Fonte: ig último segundo