
(Sustentação oral feita por este signatário no plenário do STF, julgamento da ADC 43)
O ministro Alexandre de Moraes agiu muito bem, de maneira contundente, mas técnica, ao indeferir liminarmente a temerária “Representação Eleitoral para Verificação Extraordinária”ajuizada pela Coligação Pelo Bem do Brasil. Com acerto, condenou a requerente por litigância de má-fé determinando o imediato bloqueio e suspensão das cotas do Fundo Partidário dos partidos da Coligação a fim de assegurar o pagamento da multa de R$ 22.991.544,60, correspondente a 2% do valor dado à causa. Ainda ordenou a instauração de investigação para apurar eventual desvio de finalidade na utilização da estrutura partidária, inclusive do Fundo Partidário. Para coroar, determinou a apuração da conduta de Valdemar Costa Neto. A decisão é exemplar e deve ser objeto de reflexão neste momento grave pelo qual passa o país.
O fascismo, que cravou os dentes na estrutura do governo Bolsonaro e insiste em tentar desestabilizar a nossa democracia, tem que ser enfrentado. Dentro dos limites constitucionais, mas com destemor e seriedade. É evidente que a estratégia bolsonarista é a de fomentar a violência e a instabilidade visando à ruptura institucional. Para tanto, o próprio presidente da República usou a força do cargo para atentar, por inúmeras vezes, contra as instituições, especialmente contra o Poder Judiciário.
Nunca é demais frisar que o país deve ao STF (Supremo Tribunal Federal) e ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) a hipótese de sairmos com a democraciaintacta da onda de ataques sistemáticos à ordem vigente. Infelizmente, parte do Poder Legislativo foi cooptado e faltou ao país nesse momento dramático.
A irresponsabilidade do grupo golpista usa o fanatismo da verdadeira seita em que se transformou o bolsonarismo para golpear, sob diversos aspectos, o Estado democrático de direito. As ações são orquestradas e contam com intenso financiamento de empresários que se locupletaram durante o saque aos cofres públicos nos últimos 4 anos. A ocupação e o bloqueio das estradas, o uso indiscriminado da violência, a fomentação do ódio e o ataque grosseiro às instituições se somam a uma estratégia de corroer por dentro o regime democrático.
Para tanto, fizeram uma subleitura criminosa do artigo 142 da Constituição para inventar uma hipótese de “golpe constitucional” dando às Forças Armadas o poder de tutelar a nação. Como se fosse possível uma ruptura dentro dos limites constitucionais. Ora, todo golpe é contra a Constituição! E espalharam teses esdrúxulas, como se fosse bem-vinda uma intervenção militar, com argumentos baixos e vulgares sobre um pretenso direito absoluto à falsa liberdade de expressão e de ação para justificar a violência e a sanha golpista.
É sob esse aspecto que se deve analisar a gravidade dessa “Representação Eleitoral para Verificação Extraordinária” ajuizada no Tribunal Superior Eleitoral. Lembremo-nos do grande Mia Couto: “Em tempos de terror, escolhemos monstros para nos proteger.”
Claramente, o que pretendeu a coligação bolsonarista foi tentar instrumentalizar o Poder Judiciário com o uso indevido, imoral e ilegal da estrutura partidária. Contando ainda com os milhões do Fundo Partidário. O desvio de finalidade é evidente e a responsabilidade tem que ser apurada. Essa ação nada mais foi do que uma nova tentativa de dar ares de legalidade a um golpe que vem sendo gestado há tempos. O discurso agora seria que o direito de peticionar, de socorrer-se ao Judiciário, é absoluto e tem que ser respeitado.
Daí a relevância da decisão do ministro Alexandre de Moraes. O raciocínio da representação é teratológico: pretendia anular os votos tão só da eleição do 2º turno, apenas da eleição presidencial. É clara e inquestionável a tentativa burlesca de usar o Poder Judiciário. O ministro ainda foi cuidadoso ao determinar o aditamento do pedido pois, anotou, “as urnas eletrônicas apontadas na petição inicial foram utilizadas tanto no primeiro turno, quanto no segundo turno das eleições de 2022”. Mas a coligação insistiu na argumentação falsa, estapafúrdia e de má-fé.
E foi preciso, ao fundamentar sua decisão, deixar claro que: “Os Partidos Políticos, financiados basicamente por recursos públicos, são autônomos e instrumentos da Democracia, sendo inconcebível e inconstitucional que sejam utilizados para satisfação de interesses pessoais antidemocráticos e atentatórios ao Estado de Direito, à Justiça Eleitoral e a soberana vontade popular de 156.454.011 (cento e cinquenta e seis milhões, quatrocentos e cinquenta e quatro mil e onze) eleitoras e eleitores aptos a votar.”
Ou seja, mais uma vez, o Judiciário obsta uma tentativa criminosa de romper a ordem democrática com argumentos de aparente constitucionalidade. Eis a importância não só dessa decisão, mas da independência do Poder Judiciário. Resistiremos aos que insistem em usurpar o poder, ora com a força bruta –própria dos vulgares seres escatológicos que compõem a grande massa bolsonarista–, ora com a tentativa de instrumentalizar os Poderes constituídos e a Constituição da República.
Lembrando-nos, mais uma vez, do lema internacional antifascista: “Não passarão!”
Fonte: poder 360