Padre João Medeiros Filho
A teologia é também ciência, pois preenche os seus requisitos clássicos: objetos material, formal e metodologia própria. Nela verifica-se o encontro da razão e fé (“ratio et fides”), presente nos pensadores, desde a antiguidade aos dias atuais. Baseada nesse binômio, a Igreja Católica alicerça o ensino dessa disciplina. Há séculos, em muitos países, a tradição universitária coloca tal conhecimento no patamar das outras ciências. No Brasil, o Parecer 241/99, do Conselho Nacional de Educação, deu-lhe status acadêmico, obedecidas as diretrizes do Ministério da Educação para as graduações de nível superior. Convém lembrar que reflexão teológica e universidade sempre caminharam de mãos dadas. À sombra desse pensar, nos mosteiros e conventos, nasceram os primeiros cursos superiores, inclusive no Brasil. Nas seculares instituições de ensino, a teologia foi e continua sendo fermento de crítica e reflexão, construção do saber e transformação da sociedade. No projeto original da Universidade de Brasília, havia um curso de teologia,incluído nas graduações superiores.
No Brasil, o ensino teológico acadêmico apresenta-se ainda tímido, apesar da oficialização outorgada pelo poder público. Dos três cursos autorizados e reconhecidos pelo Ministério da Educação no Rio Grande do Norte, apenas o de Mossoró prospera, apresentando-se como um espaço de pensar da fé cristã. A ausência e desistência de tais graduações devem-se, em parte, ao desconhecimento das normas do MEC e ao fato de se pensar ainda que teologia existe apenas para a formação de padres. É claro que estes não poderão prescindir de sólido conhecimento dessa ciência. Um teólogo não precisa ser sacerdote. Não raro, confundem-se determinações canônicas para a preparação de presbíteros com ensino da teologia e vice-versa. Ao solicitar credenciamento de instituições de ensino superior para ofertar bacharelados nessa área, tem-se sobretudo a intenção de formar um laicato com profundidade intelectual e cultura espiritual. O Rio Grande do Norte carece de mais lideranças católicas. Num passado próximo, a Igreja potiguar foi marcada pelo testemunho de líderes cristãos, dentre eles, um perito conciliar (Otto Guerra) e alguns comendadores pontifícios. No plano internacional, ressalta-se a importância social e eclesiástica do Movimento de Natal.
A teologia, enquanto ciência e reflexão da fé, pode e deve ser ensinada em instituições universitárias, mesmo leigas. Nisso as igrejas e o conhecimento teológico terão muito a lucrar, na medida em que irão se defrontar com outros saberes e realidades de um mundo plural. Assim, o apóstolo Paulo construiu o seu pensamento e, de modo análogo, agiram Agostinho de Hipona e outros. As normas dos sistemas de ensino deixam as denominações religiosas livres (respeitando o corpo doutrinário) para elaborar o conteúdo de seus cursos. Os elementos específicos da formação de ministros de culto poderão ser transmitidos fora da grade curricular acadêmica. É o que acontece em muitos seminários e conventos, máxime no estrangeiro.
O resultado da hesitação para abertura e manutenção de cursos teológicos oficiais é preocupante para os católicos. Em vinte e dois anos da vigência do Parecer 241/99, abrangendo uma centena de graduações teológicas, em nível de bacharelado, autorizadas ou reconhecidas pelo MEC, menos de um terço é mantido por entidades vinculadas ao catolicismo. Já elaboramos diversos projetos de credenciamento de faculdades e autorização de cursos nessa área de conhecimento. Infelizmente, dois que funcionavam no RN renunciaram à missão de ser um espaço qualificado de crítica e pensar cristão. Segundo o teólogo e professor João Batista Libânio, S.J: “a presença de cursos teológicos ajuda muitíssimo na pastoral universitária autêntica, reflexiva e não simplesmente sacramentalista, apologética ouproselitista.”
Um curso teologal reconhecido pelo MEC é inegavelmente um serviço que a Igreja presta à sociedade, confrontando a fé com a realidade do mundo hodierno. Deve ser um lugar de reflexão, destinado ao encontro daciência e fé. Este objetivo está sendo cumprido, há doze anos, pela Faculdade Católica do RN, sediada em Mossoró, magistralmente dirigida por Padre Charles Lamartine, com a supervisão e bênçãos de Padre Sátiro Cavalcanti Dantas, ícone da educação mossoroense. Nunca é demasiado repetir o conselho do apóstolo Paulo: “Examinai tudo e guardai o que for bom e verdadeiro.” (1Ts 5, 21).