Padre João Medeiros Filho
O arcebispo anglicano Desmond Tutu pregava a paz e apelava para a não violência. Tornou-se célebre a sua frase: “Baixe o tom e melhore os argumentos”. Mas, chegou à conclusão de que, em certas situações, é preciso elevar a voz. Os descompassos da sociedade brasileira exigem que, diante da desordem moral, não se cometa o erro da omissão. A indiferença acaba sendo uma forma de conivência. É premente clamar por harmonia e justiça. O desafio é identificar a qualidade desses reclamos. Ao contrário dos embates presenciados nos cenários contemporâneos, urge um clamor, seguindo-se o exemplo da rica tradição dos profetas bíblicos. Isto significa proclamar a exigência do bem e da equidade. Não se trata dos gritos histéricos desprovidos de lhaneza proferidos no Parlamento Nacional, onde se pretende que a força seja o argumento final, a emoção supere a razão, os interesses vençam a lógica e o dinheiro esteja acima da verdade e do bem.
As manifestações e os brados atuais devem ser substituídos, celeremente, pelo compromisso de uma luta séria para recompor o esgarçado tecido sociopolítico que ameaça o presente e o futuro de nossa pátria. Há de se verificar os equívocos de pronunciamentos e discursos, portadores de mais confusão e instabilidade social. Se, atualmente, a sociedade – pelos seus diferentes segmentos – não souber falar, estará fadada à destruição e ao caos. Não se trata de linguagem apocalíptica, e sim de mera constatação.
Assiste-se à derrocada de instituições indispensáveis à manutenção da verdadeira democracia. Há sinais de posturas ditatoriais e configuração de esquemas de negociatas, vantagens e privilégios adquiridos por grupos e setores oligárquicos, sob a ótica da hegemonia sedutora da idolatria do dinheiro. Não falta quem pense que todas as suas convicções e posições são justas e corretas, sem autocrítica. Tem-se uma visão emoldurada por entendimentos questionáveis, com uma noção empobrecida do sentido de humanismo e amor à pátria. É a vez das igrejas levantarem a voz, profeticamente, em prol da população. É pecado confundir ainda mais os fiéis com posições partidárias e ideológicas. Não é esse o papel de quem anuncia Deus e o Evangelho de Cristo! Mister se faz um forte e lúcido movimento de reparação para o equilíbrio da sociedade. É hora de empenhar-se pela superação dos disparates que comprometem o respeito indispensável a uma sociedade democrática. É o momento de rogar a intercessão divina. Mas, não basta falar. Há quem fale – e muito – até mesmo para se justificar e se defender pela arma criminosa da detração do outro.
Na raiz da incompetência revelada em narrativas e discursos construídos – diametralmente opostos – constata-se grave relativismo, responsável por um estilo de vida desordenado, gerador de escolhas egoístas e injustas. Há uma onda deletéria em que indivíduos, grupos ou partidos se colocam no centro, dando prioridade absoluta às suas conveniências absurdas. As instituições são atingidas frontal e mortalmente. Existe verdadeira adoração pelo poder e pelo dinheiro, o que faz indivíduos se tornarem representantes do Mal. Evidenciam-se consequências nefastas na degradação social em curso. Veem-se, com perplexidade, “a salvaguarda da moralidade” e, ao mesmo tempo, o comprometimento de intocáveis princípios. Paira no ar uma lógica que leva à defesa rígida de alguns valores e à negociação de outros por fraqueza e interesses espúrios. Dois pesos, duas medidas!
A sociedade necessita que suas instituições aperfeiçoem seus argumentos e suba a voz para salvá-la do fracasso, imposto pela falta de coerência e pelas manipulações. Isso exige destemor. Também o mundo da educação precisa desinstalar-se das rotineiras críticas conceitualistas sem compromisso efetivo e concreto com melhores dias para o povo. Fale alto o bem comum, impulsione-se o altruísmo, resgatem-se a honra, o respeito e a honestidade! Para a construção de novos projetos e sistemas é indispensável viger a verdade em lugar de calúnias e difamações. Convém lembrar as palavras do hagiógrafo colocadas nos lábios de Javé, o Deus Todo-Poderoso: “Eu vi a aflição do meu povo e ouvi o seu clamor por causa da maldade de seus gestores” (Ex 3, 7)!