A ministra do STF (Supremo Tribunal Federal) Cármen Lúcia disse que respeita a possível indicação do advogado Cristiano Zanin Martins para ocupar uma das duas vagas que ficarão abertas na Suprema Corte neste ano –a de Ricardo Lewandowski e Rosa Weber, em maio e outubro, respectivamente.
Zanin foi o advogado responsável por defender o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nos processos criminais da operação Lava Jato. “Como juíza, respeito [a indicação], desde que se cumpra a Constituição. O presidente tem o direito de escolher e cumprir sua atribuição como autoridade competente”, declarou durante entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, nesta 2ª feira (6.mar.2023).
Questionada se a indicação poderia implicar em algum problema, Cármen Lúcia negou. “Tivemos grandes ministros como Victor Nunes Leal, que foi chefe de gabinete de Juscelino[Kubitschek]. Em casos mais recentes, temos Gilmar Mendes e Dias Toffoli“, citou.
“A circunstância de ter passado pelo Executivo ou a ligação com o próprio presidente de alguma forma não macula o indicado. Acho que a discussão tem que ser: a Constituição está sendo cumprida? A Constituição diz que o ministro deve ter notório saber jurídico e reputação ilibada. E este advogado tem e já demonstrou”, destacou.
REPRESENTATIVIDADE NA CORTE
Ainda sobre as indicações às duas vagas ao Supremo, a ministra afirmou que há mulheres competentes que podem ocupar os cargos. E destacou que o presidente Lula “sempre se lembrou daqueles que são iguais em direitos, mas são minoritários”, em referência à representatividade de gênero no STF.
“Acho que a questão de representatividade nunca saiu das pautas. No caso dessas listas [de indicações], na verdade, são nomes e figuras muito importantes no direito e que se projetam”, disse.
A ministra citou a indicação ao STF pelo presidente, e disse não ter motivos para supor que em um país com mulheres “tão importantes que estão atuando”no direito não sejam lembradas por Lula no momento das indicações às vagas.
“Tenho certeza e convicção de que, sendo este um presidente que sempre lembrou das pautas daqueles que são iguais em direitos, mas minoritários no desempenho dos seus direitos, como é o caso das mulheres, não acho que isso vá deixar de comparecer na pauta. Pelo menos que ele avalie e leve em consideração no momento de sua escolha”, destacou.
MACHISMO
Sobre o STF, Cármen Lúcia afirmou que o ambiente é “majoritariamente machista”. A ministra destacou o fato de ser, com a presidente do STF, Rosa Weber, as únicas mulheres do colegiado –os demais 9 ministros são homens. Nesse sentido, a juíza destacou a importância de maior representatividade do gênero feminino nos demais espaços de poder.
A juíza citou o caso em que a ministra Rosa Weber foi silenciada por colegas da Corte em plenário. “Tive de pedir a um colega que a presidente Rosa pudesse se manifestar, pois era continuamente interrompida. Isso não é uma malícia qualquer, mas uma estrutura do Brasil”, destacou.
Cármen Lúcia falou sobre as mulheres serem maioria na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), mas que nenhuma chegou à presidência da instituição.
“Somos uma sociedade em que o conhecimento favorece mais os homens em todos os poderes, e isso leva a um número maior deles conversando e se fazendo ouvir. […] A igualdade está no direito de falar, ouvir e ser escutada em melhores condições. […] Precisamos trabalhar para superar isso”, afirmou.
8 DE JANEIRO
A ministra falou quanto à competência da Suprema Corte para julgar os mais de 900 denunciados pelos atos do 8 de Janeiro. A juíza destacou a atuação dos ministros desde às manifestações de extremistas e que o colegiado “precisará se debruçar para melhorar a tipificação de terrorismo doméstico”.
A juíza falou que com os avanços tecnológicos, a Corte poderá julgar os casos de forma mais célere e que a atual estrutura poderá ser adequada para conseguir atender ao fluxo de processos.
Perguntada sobre as incitações de ódio contra o STF, a ministra afirmou que “a responsabilização só ocorre após a comprovação objetiva. Mas, na medida em que na atuação como autoridade há palavras contra a instituição, ministros ou outras pessoas indicadas, há ingredientes que fecundam a raiva”.
“Houve, sim [a incitação], não só de uma pessoa, mas de autoridades que formularam questionamentos e xingamentos públicos contra nós ministros, isso encontrou eco. O que acho muito grave”, acrescentou a ministra Cármen Lúcia.