A solenidade de “Corpus Christi”

Padre João Medeiros Filho

A festividade de Corpus Christi (Corpo de Cristo) é celebrada sessenta dias após o domingo da Páscoa. Foi instituída pelo Papa Urbano IV, por meio da Bula “Transiturus”, em 8 de setembro de 1264. Na época, o Sumo Pontífice tomou conhecimento de que a freira belgaJuliana Mont de Cornillon, da diocese de Liège, tinhavisões de Jesus pedindo-lhe uma festa litúrgica anual em honra do Santíssimo Sacramento. Outro motivo influenciou a decisão de Sua Santidade. De acordo comrelatos eclesiásticos, Padre Pedro (da diocese de Praga)tinha, em alguns momentos, dúvidas sobre a presença de Cristo na Hóstia Consagrada. Voltando de Roma para aTchecoslováquia, o aludido sacerdote foi celebrar na cripta de Santa Cristina, em Bolsena (Itália). Ali, aconteceu algo miraculoso. Durante a elevação, começaram a cair gotas de sangue sobre o altar e o corporal. Este foi levado para a Catedral de Orvieto, onde é conservado até hoje.

A Eucaristia é a prova permanente da doação plena de Deus, ternura do Pai, abraço divino que nos é reservado, beijo do Eterno, que no silêncio do Pão da Vida mostra-nos seu amor e perdão. Eis o Tão Sublime Sacramento,segundo o poema de Santo Tomás de Aquino,continuidade da presença celestial temporalizada na Encarnação. Cristo quis se unir à humanidade. E esta, a partir de então, passa a ter um valor transcendente. O ser humano torna-se sacrário de Cristo! A fragilidadeassumida pelo Verbo Encarnado é elevada no Sacramento Eucarístico. Os contemporâneos de Jesus, ao ouvirem do Mestre que haveriam de comer a sua carne e beber o seu sangue, consideraram duras demais as suas palavras (cf. Jo 6, 53-60). E, não querendo aceitá-las, foram se retirando. Cristo questiona, então, os apóstolos: “Não quereis também vós partir?” Pedro respondeu-lhe: “A quem iremos, Senhor? Só Tu tens palavras de vida eterna.” (Jo 6, 68-69). A Encarnação é, sem dúvida, um gesto inefável do amor de Cristo. Mas, Ele quis ir além, culminando com a Eucaristia. Graças à fé, podemos sentir essa teofania de Jesus, concedida por Deus a seus filhos diletos.

O Pão Eucarístico perpetua também os ensinamentos do Divino Mestre. Primeiramente, dá-nos a lição dehumildade e serviço. Com efeito, o que entre vós for o menor, esse é o maior.” (Lc 9, 48). Na Hóstia, o Filho de Deus faz-se pequeno para caber em nosso coração. Nessemistério sacramental, o Senhor deixa-nos o legado daverdadeira fraternidade. Torna-se alimento igual para todos: pobres e ricos, santos e pecadores. Ele ajuda-nos acompreender o perdão. É difícil perdoar, pois ultrapassa o entendimento e a lógica humana. No Pão Sagrado, o Redentor nos ensina a ser simples, desarmados e de braços estendidos. Deu-nos o exemplo, quando pendeu da Cruz, precedido pelo ato de sua generosidade na Última Ceia.No Altar, Jesus continua seus milagres de misericórdia e compaixão. Durante sua existência terrena, curou doentese ressuscitou mortos. Hoje, pela Comunhão revitaliza os irmãos amortecidos pela dor, angústia, ausência de Deus etibieza na fé. 

Quem sente falta do Divino, vai buscá-Lo na grandeza dessa presença silenciosa. Ele deixa que sua Palavra repercuta no íntimo de quem se achega para mitigar todo tipo de fome e sede. “Não vos deixarei órfãos” (Jo 14, 18), largados à própria sorte, prometeu o Senhor. Na Eucaristia contamos com a companhia divina, antecipação da eternidade, onde gozaremos o definitivo de nossa história. A Eucaristia é Deus em Cristo, amainando em nós as saudades do Infinito.

Cristo é nossa fortaleza e nos ajuda a caminhar. Quanto mais O temos presente, mais O buscamos, pois Ele é Mistério, ou seja, o Inesgotável. Vivemos a preparação e o aprendizado do nosso encontro definitivo com Ele. Aoparticiparmos da Santa Comunhão, já não ficaremossozinhos, Jesus estará conosco. Já não sou eu quem vive, é Cristo que vive em mim.” (Gl 2, 20). Cônego Luiz Gonzaga Monte, um sábio e santo que morou entre nós, expressou seu sentimento místico e teológico: “Sem a Eucaristia somos pequenos demais para o Céu, com ela grandes para a terra.