Padre João Medeiros Filho
Eis o que indagou um mestre potiguar a seus alunos. A resposta foi um silêncio acompanhado de indiferença, frieza e possivelmente outros sentimentos. Após insistir com a pergunta em várias salas de aula, levanta-se a mão tímida de um aluno, com rendimento acadêmico acanhado. O mestre observou a taciturna reação dos estudantes com certa perplexidade e tristeza. Lembrou-se de uma pesquisa da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo – USP, realizada no início desta década, mostrando que mais da metade dos alunos dos cursos de licenciatura daquela instituição de ensino superior não estão dispostos a se tornarem professores. Detalhe inquietante: licenciaturas foram criadas exatamente para formar docentes.
É voz corrente o quanto os mestres são valorizados e estimados em países, onde acontece uma verdadeira revolução educativa e cultural. Com tal apreço, tornar-se professor é sinônimo de grande reconhecimento, fazendo com que ótimos alunos almejem o magistério. No Brasil, vislumbra-se exatamente o inverso. Não raro, aqueles com menor desempenho escolar, por falta de opções e um ensino fundamental de qualidade, escolhem a docência. Sem atrativos, o que levaria um jovem a buscar “uma vida heroica, esse martírio, a virtude cristã medieval da mortificação e renúncia? O nosso professor é um malabarista, espartano e asceta”, exclamou, por ocasião do Dia do Mestre, na Câmara dos Deputados, o renomado educador Monsenhor Walfredo Gurgel, deputado constituinte em 1946. Isto evoca à nossa memória o conhecido conto-metáfora de Machado de Assis, intitulado “Um apólogo”.
Se hoje, nas escolas públicas, verifica-se um déficit de docentes para disciplinas básicas (sem contar o desvio de função), considerando-se o pífio desempenho nas avaliações oficiais, o que acontecerá com a educação das novas gerações? É preocupante a ausência de estadistas e educadores, que estejam acima de interesses político-partidários, corporativistas ou ideológicos, que pensem com seriedade em educação. Inexiste vontade política e fundamentalmente compromisso com o futuro da nação. O que se pode esperar desse menoscabo, senão o agravamento da deterioração do ensino e, consequentemente, o esgarçamento do tecido social? Enquanto governantes não repensarem seriamente a realidade educacional, teremos um resultado deprimente, incapaz de contribuir para as transformações, das quais a nação tanto necessita. Até quando a educação será moeda política e eleitoreira em nossa pátria? Queremos quantidade ou qualidade, espaço de raciocínio e criatividade ou lugar de ilusão e faz de conta, do viés e discurso ideológico?
Durante doze anos, participei de conselhos de educação. Por vezes, constatava mais ideologia do que pedagogia, mais narrativas do que objetividade, mais sofismas que certeza ou verdade. É preciso tempo e empenho para estabelecer prioridades e estratégias, pois educação não se improvisa. A história de descaso e malversação de administradores, a leviandade na aplicação dos recursos existentes, levam-nos a pensar que inexistem visão e gestão educacionais eficazes, bem como cobrança das parcas e inconsistentes políticas públicas no setor. “Neste país, brinca-se de ensinar. A escola parece um sisudo e mal apresentado espetáculo de mamulengos, sem menosprezar a riqueza de nosso rico folclore”, afirmou Celso Furtado, quando Ministro da Cultura, na década de 1980.
Será que o recente sufrágio das urnas trará algum alento e esperança para a sociedade e os nossos educadores? Investir em educação vai contra a sede de manipulação, egoísmo, desigualdade e injustiça. Há que formar para a responsabilidade e liberdade. Necessita-se dar um basta ao imediatismo, aos arranjos, aparências e aviltamentos do ser humano, imagem e semelhança de Deus. Educa-se, ao promover e dignificar o homem, reduzindo-se tudo aquilo que concorre para a sua destruição. Há muitas indústrias de morte, alimentando uma perversa cadeia político-econômica, incapaz de ser instrumento de humanização. Vai aqui o nosso abraço de gratidão e incentivo aos educadores e a todos “aqueles que não medem esforços em seu contínuo engajamento, contra a sede de dominar, em favor da lapidação do homem, criado livre e soberano, nunca objeto de ditadores cotidianos do estilo de vida e consequentemente do espírito”, dissera o monge beneditino Dom Lourenço de Almeida Prado, despedindo-se do Colégio São Bento (RJ), após sessenta anos de profícua direção. “Ensina ao jovem o caminho a seguir e ele não se desviará, mesmo quando envelhecer” (Pr 22, 6).